O dia de finados, é dia de reflexão, de saudade e de esperança.
A morte é ainda assunto-tabu, recalcado, silenciado.
Preferimos viver como se a morte não existisse.
Mas, na sociedade atual a morte é também trivializada
com as guerras, calamidades, eutanásia, aborto,
acidentes com auxílio da mídia.
Há os que preferem fazer da morte uma experiência soft,
é a “morte-soft”, relegada aos hospitais, funerárias e religiões.
Aí a morte é maquiada, relativizada pelas instituições,
chamada também de “morte digna”.
Muitos de nós vivemos uma “vida inautêntica”,
uma existência falsa porque não nos permitimos
refletir e aceitar a morte.
A dura realidade é que a morte faz parte da vida, é o fim do curso vital,
é uma invenção da própria
vida em sua evolução.
Morrer é uma experiência profundamente humana.
Aliás, é a morte que confere um certo gosto e encanto à vida, pois se tudo fosse indefinidamente repetível, a vida se tornaria indiferente, insossa e até desesperadora.
E então, a morte é um bem, uma manifestação
da sabedoria do Criador.
“Nada mais horrível que um eterno-retorno” (Sto Agostinho).
Vemos assim que a morte não se opõe à vida, mas ao nascimento.
A vida humana será sempre uma “vida mortal”,
só na eternidade teremos uma “vida vital”.
Para os que creem na eternidade, a morte é porta de entrada da vida, o acesso a uma realidade superior, a posse da plenitude.
Assim a morte é um ganho, verdadeira libertação, uma bênção que livra a vida do tédio.
Porém, do ponto de vista racional ou filosófico, a morte repugna.
Budha escreveu: “O homem comum pensa com indiferença na morte de um estranho, com tristeza na morte de um parente e com horror na própria morte”.
Outro pensador, Epiteto, disse: “Quando morre o filho
ou a mulher do próximo, todos dizem: é a lei da humanidade.
Mas, quando morre o próprio filho ou a própria mulher,
o que se ouve são gemidos, gritos e lágrimas”.
A ressurreição de Jesus trouxe uma revolução em relação à morte,
transformou o “poente em nascente”,
Cristo “matou a morte”.
Bem escreveu o poeta Turoldo:
“morrer é sentir quanto é forte
o abraço de Deus”.
O fim transforma-se em começo e acontece
um segundo nascimento, a ressurreição.
“Então, descansaremos e veremos.
Veremos e amaremos. Amaremos e louvaremos.
Eis o que haverá no Fim que não terá fim” (Sto Agostinho).
A fé nos garante que a morte não é uma aniquilação da vida,
mas uma transformação.
O homem vive para além da morte.
Não precisa reencarnar.
Creio na ressurreição da carne e no mundo que há de vir.
A morte será então a maior festa da vida porque com ela
dá-se o início da plena realização da pessoa humana.
Habitaremos com Deus com um corpo incorruptível,
espiritual e glorioso.
Com Santa Terezinha, todo cristão pode dizer:
“Não morro, entro na vida”.
A morte não é apenas um fim, ela é também e principalmente um começo.
É o início do dia sem ocaso, da eternidade,
da plenitude da vida.
A vida é imortal espiritualmente falando.
Na morte chegamos a ser plenamente
“ Teu rosto Senhor é nossa pátria definitiva”.
No céu veremos, amaremos, louvaremos, diz Santo Agostinho.
A participação na vida divina faz brotar
em nossos corações, assombro e gratidão.
Sem fé, porém a morte é absurdo, inimigo, derrota, ameaça, humilhação, tragédia, vazio, nada.
Na fé, a morte é irmã, é condição para mais vida, é coroamento e consumação;
é revelação e glória do bem.
Por fim, a morte tem um valor educativo:
ensina o desapego da propriedade privada,
iguala e nivela todas as classes sociais,
relativiza a ambição e ganância,
ensina a fraternidade universal na fragilidade da vida,
convida à procriação para eternizar a vida biológica,
rompe o apego a circuito fechado entre as pessoas
mesmo no matrimônio,
leva ao supremo conhecimento de si
e oportuniza a decisão máxima
e a opção fundamental da pessoa.
Para morrer bem, é preciso viver fazendo o bem:
“levaremos a vida que levamos”.
O bem é o passaporte para a eternidade feliz
e o irmão que ajudamos será o avalista de nossa glória no céu:
“Vinde benditos !”
Dom Girônimo Zanandréa
http://www.catequisar.com.br/texto/materia/celebracoes/finados/18.htm